Um dos grandes expoentes do samba paulista, o compositor e zoólogo Paulo Vanzolini morreu na noite deste domingo, aos 89 anos, em São Paulo. Ele estava internado desde a quinta-feira passada no hospital Albert Einstein com pneumonia – a internação coincidiu com a data de seu aniversário. Segundo o hospital, Vanzolini morreu devido a complicações relacionadas à doença. O enterro será nesta segunda, no Cemitério da Consolação, na capital paulista. Paulo Vanzolini era casado com a cantora Ana Bernardo e teve cinco filhos com sua primeira mulher, Ilze.
Considerado ao lado de Adoniran Barbosa o grande nome do samba em São Paulo, ele ficou conhecido pela autoria de clássicos da música brasileira como Ronda (De noite eu rondo a cidade / A te procurar sem encontrar / No meio de olhares espio em todos os bares / Você não está), Praça Clóvis (Na praça Clóvis / Minha carteira foi batida / Tinha vinte e cinco cruzeiros / E o teu retrato) e Volta por Cima (Reconhece a queda e não desanima / Levanta, sacode a poeira / E dá a volta por cima).
Sobre esta última canção, Vanzolini a considerava um fracasso “porque ninguém entendeu que o importante não é dar a volta por cima, é reconhecer a queda”. Já sobre Ronda, comentou: “Essa música é de uma pieguice desgraçada.”
Apesar de ser autor de mais de 70 músicas, Vanzolini preferia ser reconhecido pelo seu trabalho como zoólogo. Como cientista, ele escreveu mais de 150 artigos acadêmicos. Foi diretor do Museu de Zoologia, da USP, onde trabalhou por mais de 50 anos, e foi premiado pela Fundação Guggenheim, em Nova York, pelo sua obra científica. Em 2008, ele doou ao museu o acervo de sua biblioteca particular de 25.000 livros, na qual colecionava inclusive obras raras, periódicos e mapas. Segundo o governo de São Paulo, o acervo tem valor estimado em 600.000 reais.
Boemia – Nascido em São Paulo em 1924, Vanzolini se mudou com a família para o Rio de Janeiro aos 4 anos de idade. Dois anos depois voltou à cidade natal, onde desenvolveu sua paixão pelo samba. Começou a frequentar rodas de boêmios na adolescência, mas jamais deixou a boemia afastá-lo de outra paixão, os estudos. Já interessado por zoologia de vertebrados, entrou para a a Faculdade de Medicina, onde se diplomou em 1947.
A juventude também foi marcada por operações para tratar um problema nos ossos, que deixaram cicatrizes na perna. Incomodado com a fama de menino doente que tinha na família e decidido a ganhar a vida com seu próprio sustento, saiu da casa dos pais e foi morar no Edifício Martinelli, no centro de São Paulo. A mudança o aproximou mais da boemia, já que no prédio havia um “táxi-dancing” (salão onde dançarinas aguardavam clientes, que pagavam para dançar). Vanzolini e os amigos, porém, frequentavam o lugar de graça devido à amizade com os músicos e com as dançarinas.
Após o casamento com Ilze, então secretária da Reitoria da USP, o compositor se mudou com a mulher para os Estados Unidos, onde se tornou Doutor em Zoologia pela Universidade de Harvard. O período americano não foi dedicado apenas à vida acadêmica. Nos EUA, Vanzolini conviveu com músicos de jazz em Nova Orleans – além disso, suas principais letras teriam sido escritas nessa época.
Hobby – Vanzolini nunca estudou música e nem pensou em abandonar a biologia para ser compositor profissional. As músicas eram um hobby para ele: as composições eram feitas nas horas vagas ou para matar as saudades. Mas é inegável sua importância para a música brasileira e, principalmente, para o samba paulista.
A última composição foi Quando Eu For Eu Vou Sem Pena, gravada por Chico Buarque em 1997. Autodiagnosticado “duro de ouvido”, Vanzolini dizia não saber distinguir ritmo, tom ou qualquer outra técnica musical. O que contava era sua paixão pela música e pelos versos das canções. Nos últimos anos, ele reunia os amigos em casa para um encontro de “Os Ignorantes do Samba”.
Em 2009, o cineasta Ricardo Dias lançou o documentário Um Homem de Moral, que permite conhecer o universo musical de Vanzolini. O filme mostra também a vida profissional dele como zoólogo.
FONTE – VEJA